Domingo, 4 de Fevereiro de 2007

E antes do Regicídio de 1 de Fevereiro de 1908?

Neste post do Combustões a propósito do 99º. Aniversário do assassinato do Rei D.Carlos e do Princípe Herdeiro Filipe, aponta com convicção o seu autor, cujos textos muito aprecio e são motivo de visita diária, como causa para uma série de trágicos acontecimentos que se verificaram em Portugal no decorrer do século XX, o brutal regicídio de 1908. Depreende-se das suas palavras que se a monarquia constitucional tivesse sido mantida até aos nossos dias, Portugal, hoje, fruto da liderança de homens pré-destinados para esse tipo de funções, seria um País bem melhor do que o actual. Talvez sim, talvez não, isso é coisa que nem o Miguel Castelo Branco nem ninguém, algum dia o poderá saber. E como tal não é possível e já que se fala da separação de Portugal da Europa, questiono-me se esse divórcio não terá principiado bem antes, algures no início do Séc. XVI, no Reinado de D.Manuel I, quando este monarca com as suas ambições ibéricas terá iniciado um processo de destruição do trabalho que levou um século a edificar pelos seus antepassados. Portugal, na época um reino vanguardista que liderava o domínio das ciências, pólo de atracção dos cérebros de toda a Europa, enveredou por um longo caminho de intolerância e regressão. Que diria o Infante desta política que levou os estudantes da Universidade de Coimbra a desconhecerem, em pleno Séc. XVIII, os trabalhos de Copérnico, Galileu e Newton, só para referir os mais famosos. Que diria D. João II se lhe contassem que a grandeza do seu reino, 400 anos depois do Tratado de Tordesilhas, seria apenas uma miragem do passado que cegava os novos governantes ao ponto de conduzirem Portugal à humilhação e ao descrédito internacional que foi o ultimato inglês. Acreditaria ele que em 1891 Portugal estaria falido ao ponto de durante 90 dias a convertibilidade das notas de banco vir a ser suspensa. Será que a taxa de analfabetismo de aproximadamente 75% (Censos de 1900) em comparação com as taxas inferiores a 1 % de países como a Noruega, Dinamarca, Suécia ou a Alemanha já não seria um sintoma dessa separação da Europa. A D.Carlos é gabado e reconhecido o seu patriotismo, a sua apetência para as artes, a paixão pelas investigações oceânicas, o tiro certeiro mas faltou-lhe o que Portugal mais precisava, capacidade política para mudar o rumo dos acontecimentos como o atestam as treze eleições gerais no seu reinado de 19 anos (bem longe do recorde da primeira república, há que o registar, mas não deixa de ser uma marca simpática). Depois D.Carlos falhou naquelas pequenas coisas a que o pobre dá muita importância, um Rei tem que dar o exemplo, não pode em tempos de vacas magras trocar de iate real como quem muda de camisa (começou com o Amélia I e já ia no Amélia IV), o perdão total da dívida dos adiantamentos à casa real é também outro exemplo de insensibilidade política que muito contribuiu para o atear da fogueira. Tivesse D.Carlos reinado em épocas anteriores, as recordações de hoje seriam outras, quis o destino que fosse ele a receber o pesado fardo dos erros dos seus antepassados. O grande responsável pela queda da monarquia e pelo caos político que se seguiu foi a própria monarquia, foi ela que encaminhou Portugal para a miserável situação de então, criando-se as condições ideais para que o Partido Republicano e organizações extremistas como a Carbonária crescessem tanto em tão pouco tempo. É verdade que, aquando da criação do Partido Republicano, o apoio popular deste era minoritário mas já não se pode afirmar o mesmo em relação aos últimos anos da monarquia. E os factos são que em 1908 o Partido Republicano venceu as eleições na Câmara Municipal de Lisboa (toda a vereação do P.R.P) e que após a proclamação da República, a adesão foi unânime em todo o país, não se tendo verificado manifestações contrárias nem por parte dos militares, nem por parte dos civis.
publicado por Conde da Buraca às 08:20
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De P.Porto a 7 de Fevereiro de 2007 às 23:20
Muito do que eu queria comentar sobre o seu post já foi dito no comentário anterior que aqui deixou Luis Bonifácio. Ainda assim, mais algumas notas.
A) Convertibilidade da moeda. Certo, esteve suspensa durante 15 dias. E quanto ao descalabro monetário e cambial a que a República arrostou Portugal? Indo um pouco mais longe no assunto, para além da desvalorização brutal do Escudo diante da Libra, a situação foi de tal modo grave que nem metal havia para cunhar moedas, e assim chegaram a circular “cédulas” para substituir as moedas.
B) Analfabetismo É certo que em 1910 havia 75% de analfabetos. E em 1926? Quer arriscar um número ? Procure, e arrepie-se. Aproveito para ir mais longe; um dos primeiros actos da República em termos de educação foi a criação de Univerisades em Lisboa e Porto num tempo em que a Universidade de Coimbra chegava e sobrava. Portanto, imagine-se um país de analfabetos e o Poder a passar as Univeridades de 1 para 3. Boa obra, mas pouco proveito, até porque não foi por isso que passaram a haver mais universitários em Portugal. Agora, é certo que alguém beneficiou. Por exemplo, Afonso Costa foi nomeado lente na Univesidade de Lisboa: já não se pode dizer que não valeu a pena.
C) (1) Aquando das primeiras eleições da República, em 1911, a fraude eleitoral foi de tal ordem que apenas foram eleitos deputados do PRP e alguns poucos independentes. Nestas mesmas eleições os republicanos mantiveram uma das regras eleitoriais que tanto criticaram, justificadamente, ao regime monárquico, isto é, em circulos onde existisse apenas uma candidadura atribuiam-se todos os votos à única lista apresentada. A intimidação era de tal ordem que em 50% dos círculos eleitorais só se apresentaram listas do Partido Republicano Português, logo, não houve eleições, e os deputados assim “eleitos” eram todos do... PRP; As eleições em Lisboa chegaram a estar em risco de acontecer, por desnecessárias, já se vê, mas algum decoro acabou por pervalecer. Aquilo é que foi uma democracia!
(2) Na lei eleitoral de 1913, de Afonso Costa, pela primeira vez se proibiu expressamente o voto das mulheres. A médica Adelaide Cabete votava no tempo da “ominosa” Monarquia. O que é fantástico é que já cheguei a ler na net, e já me foi relatado que se ensina nas escolas, que, com a implantação da República, as mulheres adquiriram direito de voto.
(3) Uma das linhas de força do republicanismo português foi a promessa de voto universal. Nunca cumpriram. Aquilo que mais se assemelhou a voto universal na I República foi a eleição de Sidónio Pais, com cerca de 900,000 votos. Por sinal, foi o único Presidente eleito durante a I República. Assassinado Sidónio Pais, reposto o país nos carris da intolerância e do sectarismo, foi novamente retirado o direito de voto aos analfabetos, isto é, pelo padrões da época, ao Povo. Raramente os historiadores “de serviço” referem isto.
(4) Pode pensar-se que isto foi assim porque era o princípio. Mas não, foi sempre assim, durante 16 anos em que Portugal deixou de ser um Estado de Direito. Veja-se o que aconteceu nas últimas eleições da I República, em 1925: de 2,000,000 de recenceados apenas votaram, ou puderam votar, menos de 290,000. Em Lisboa, a capital da República e do republicanismo, de 600,000 recenceados apenas votaram 24,000; há relatos de listas não aceites e de intimidações para impedir o acesso às urnas de cidadãos que se sabia não irem votar nos partidos do regime. Isto já a I República era um morto-vivo, agora pode imaginar-se, e quem se quiser documentar, confirmar, como foi enquanto a I República teve vitalidade.
P.Porto petrusport@hotmail.com

De Conde da Buraca a 10 de Fevereiro de 2007 às 19:46
P.Porto,

Agradeço as interessantes informações que aqui deixou sobre a 1ª República mas por mais caótica que ela tenha sido, isso não suaviza o fracasso da monarquia constitucional.
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